domingo, 30 de agosto de 2015

POLITICA: Roberto Amaral: ‘Não tenho nenhum respeito ético pelas posições de Aécio’

Expressão histórica da esquerda no país, ex-presidente do PSB diz que aparente recuo de senador mineiro sobre impeachment “faz parte de algum jogo de política menor”, e volta a criticar seu partido
Por Eduardo Maretti, da RBA
O ex-presidente nacional do PSB Roberto Amaral, representante histórico da esquerda brasileira, tem defendido a formação de uma frente popular para unir forças progressistas em defesa da democracia . Crítico mordaz de seu próprio partido, o PSB, que refundou no pós-ditadura, em 1985, junto com Jamil Haddad, Antônio Houaiss e Evandro Lins e Silva, Amaral comentou, em entrevista à RBA, a mais recente declaração do senador Aécio Neves (PSDB-MG). “Eu não tenho nenhum respeito ético pelas posições do ex-candidato Aécio”, diz Amaral.
Em aparente recuo, o senador tucano disse em entrevista a Kennedy Alencar, publicada hoje (28), no blog do jornalista, que “ainda não está claro” haver motivos para o impeachment de Dilma Rousseff. “Reconheço isso. Mas nada impede que dentro de algum tempo isso ocorra”, afirmou ainda Aécio. “Dizer que não tem motivo, ‘ainda’… Quer dizer, ainda vai se procurar? E ele descobriu agora que não tem motivo?”, questiona Roberto Amaral.
Ele também não economiza críticas ao seu partido, o PSB, que apoiou Aécio no segundo turno em 2014, e volta a dizer que o partido adotou uma postura “oportunista”. “Vejo muito mal (o papel do PSB no atual processo político), desde agosto do ano passado, quando ele decidiu não apoiar a Dilma”, diz. “A decisão do PSB de apoiar Aécio foi burra e oportunista.”
Ministro de Ciência e Tecnologia do governo Lula (entre 2003 e 2004), Amaral vem criticando seu partido também pela intenção, hoje adiada, de alguns líderes de se fundir com o PPS, que “completaria a direitização do partido”.
Está programado para 5 de setembro o lançamento da Frente Brasil defendida por Amaral, em Belo Horizonte.
Hoje, o senador Aécio Neves parece ter recuado e afirmou que “ainda não está claro” que haja razão jurídica para o impeachment. Como o sr. recebe tal afirmação?
Eu não tenho nenhum respeito ético pelas posições do ex-candidato Aécio. Ele assumiu o lado golpista. Ele agora, com esse negócio de dizer que não tem motivo, “ainda”, é uma coisa sem sentido. Tem motivo ou não tem? Dizer que não tem motivo ainda… Quer dizer, ainda vai se procurar? E ele descobriu agora que não tem motivo? E quando ele estava pedindo novas eleições?
Então, não levo a sério, não considero importante nem relevante a declaração dele. Isso faz parte de algum jogo de política menor, e nós temos que nos preocupar com questão política maior. A questão fundamental é o respeito ao processo. Ele está querendo recuperar as tradições da UDN, que toda vez que perdia eleições propunha um golpe de Estado. O que temos que discutir é a voz soberana das urnas.
Como avalia a conjuntura?
É fundamental no processo democrático a defesa do mandato da presidente da República, independentemente de ser a Dilma, como era importante garantir a posse e o mandato de Juscelino. O que resta é a regra do processo democrático. Esta é a regra democrática: você disputa, ganha ou perde e vai em frente. Isso é fundamental para a ordem democrática. Isso é fundamental para a economia brasileira.
A economia brasileira, a economia produtiva, a nossa política externa, não podem ficar permanentemente à espera de uma crise, esperar se a crise se agrava, ou se vai amainar. Nós temos que ingressar na normalidade. Já se vão quase oito meses da posse e quase um ano das eleições. As eleições já terminaram. O que estou querendo é que os liberais entendam que o pleito do impeachment ou da convocação de eleições é um pleito golpista. Quando em 1954 ficaram inventando o “mar de lama”, a questão não era o “mar de lama”, que provou-se que era inexistente. A questão era impedir o governo Vargas, e impedir o reajuste do salário mínimo e impedir as estatais que ele estava criando.
A mesma coisa se operou em 1964. O problema era a promessa de reformas de base do Jango, e a direita então inventou que estava defendendo a Constituição, os liberais acreditaram nisso, foram às ruas a favor da queda de Jango, e o primeiro ato dos golpistas foi destruir a Constituição.
Como o sr. vê o desdobramento da crise, com otimismo ou pessimismo?
O que estou querendo passar é que a questão vai além da sustentação ou não do mandato da Dilma. Com o mandato dela mantido, temos que enfrentar a ascensão do pensamento de direita; sem o mandato dela, temos que enfrentar a ascensão das forças de direita. É preciso dar sustentação de centro-esquerda ao governo dela. A política se faz com correlação de forças. Se as forças progressistas liberais de esquerda não fortalecerem o governo da Dilma, ela vai ficar nas mãos das forças conservadoras.
Qual sua posição sobre o papel do PSB nesse processo?
Vejo muito mal, desde agosto do ano passado, quando ele decidiu não apoiar a Dilma. Ele não entendeu que o projeto Aécio – e está muito claro agora – era um processo de direitização, de redução dos direitos dos trabalhadores e de autoritarismo, que está construindo esse clima de intolerância no Brasil.
O sr. chegou a dizer há alguns meses que o PSB está dominado por oportunistas…
É o seguinte: a decisão do PSB de apoiar o Aécio foi uma decisão burra e oportunista. Por que oportunista? Porque o fez pensando que o Aécio ia ganhar as eleições. Então, pegou todo o nosso patrimônio, pegou toda a nossa história, todos os nossos projetos e jogou nessa aventura, pensando que o Aécio ia ser eleito. Só por isso. E foi uma decisão burra porque, diante da crise dos partidos de esquerda – e não precisa explicar, está todo mundo vendo essa crise –, o PSB poderia ser o grande desaguadouro dos quadros de esquerda, progressistas, que estão insatisfeitos com seu partido.
Se Eduardo Campos não tivesse morrido, o PSB poderia ter sido esse desaguadouro?
É o mais provável, mas não estou totalmente seguro disso, porque tudo dependeria de como seria o final de campanha, como seria no segundo turno, como seria a posição do partido. Ele morreu no inicio do primeiro turno.
O sr. também já criticou muito a eventual fusão do PSB com o PPS, que foi adiada…
Foi adiada porque houve uma reação da militância, mas a expressão é correta: foi adiada. Não quer dizer que foi de todo afastada. Isso completaria a direitização do partido.
Nesse quadro, o sr. teria condições de se manter no PSB?
O meu papel no PSB sempre foi de puxar o partido pela esquerda. Quando decidi com Antônio Houaiss e o Jamil Haddad refundar o partido, nós pensávamos em um partido socialista. A minha posição não mudou. Eu continuo achando que o Brasil precisa de um partido socialista e coerente, e vou continuar lutando por isso.

Foto: Google
informação ; Revistaforum.com  


Nenhum comentário:

Postar um comentário